Telenovelas:
sonho e realidade
Wanderlino
Arruda
Não sei se você já parou
um pouquinho para pensar sobre o que as
telenovelas vêm representando para
a sua família e para o povo em geral,
o que elas trazem de realidade e o que elas
podem oferecer de sonhos ou de ilusões.
Alguém dizer, hoje, que não
assiste a novelas, que não dá
confiança a elas, que não
tem tempo para acompanha-las, nem sempre
representa uma verdade verdadeira. De um
ou outro capítulo, ou mesmo de uma
seqüência deles, ninguém
escapa, pois a tevê, queira ou não
queira alguém, ocupa sempre um lugar
importante na casa, seja na sala, seja no
quarto de dormir. Em algumas classes mais
bem situadas, podem existir até muitos
aparelhos em diferentes partes da moradia,
incluindo aí, o já indispensável
vídeo-cassete. Assim, o indivíduo
pode escapar do imposto de renda, da praga
da política, mas nunca da influência
da televisão.
E qual é mesmo a função
social da telenovela? Tem ou não
tem ela alguma utilidade prática,
além do divertimento e da simples
ocupação do tempo ocioso?
É a novela didática, isto
é, contribui para alguma aprendizagem,
aumento de cultura? Que tipo de expectativas
decorre do acompanhamento de uma novela,
do convívio diário com as
personagens, do amor e do desamor que elas
provocam, das simpatias e das ojerizas,
da beleza e da feiúra, das carências
e dos requintes? Muitas são as interrogações,
mas não sei quantas poderá
o leitor dar em termos de sua própria
experiência. Quem sabe talvez seja
esse um trabalho para sociólogos
e psicólogos, para outros os cientistas
do comportamento humano. O certo é
que elas têm de ser notáveis
por alguma coisa, pois, do contrário,
não poderiam trazem tanta preferência
por parte de gente de todas as idades, aqui,
neste alegre e sofrido Brasil, e mesmo no
exterior.
Acredito que, até certo ponto, as
personagens das novelas são pessoas
do nosso dia-a-dia, as mesmas que convivem
conosco ou são alvos de nossa atenção
nas notícias dos jornais e das revistas,
ou nos noticiários da própria
televisão. Vejamos o exemplo da estratificação
social, praticamente tudo em termos de oposição,
aparecendo os embates emocionais entre ricos
e pobres, educados e mal-educados, finos
e grosseirões, bons e maus, virtuosos
e pecadores, novos e velhos, desprendidos
e ambiciosos, grã-finos e bregas.
Há também os paralelos e as
diferenças nas profissões,
perfilando ao mesmo tempo, o industrial,
o comerciante, o banqueiro e seus empregados
de trabalho leve e trabalho pesado, todo
mundo ao lado do médico, do padre,
do advogado, do motorista, da secretária,
do jagunço urbano ou rural, da empregada
doméstica, da mãe-preta bondosa
e conselheira, da dona de casa sobrecarregada,
tudo dentro de determinadas normas, centrado
por valores, situações e costumes
mais diversos.
Destaquem-se ainda o deslumbramento dos
ricos, a problemática dos pobres,
a luta homérica para a sobrevivência
da classe-média, esta espremida entre
o pólo da ostentação
da riqueza e o sofrimento marcante da miséria
dos pobres. O rico sempre com uma montanha
de bens supérfluos, buscando cada
vez mais a ascensão social.
Os pobres mergulhados na crendice (mal também
dos ricos), no jogo do bicho, nas escolas
de samba, nas barracas das feiras, no futebol,
nas profissões de baixa renda, morando
sempre em favelas, cortiços, ruas
antigas e afastadas, vivendo em locais barulhentos
e de grande densidade populacional. A felicidade
raramente está desligada do dinheiro
e do poder, do luxo e da boa vida, principalmente
das lindas casas bem decoradas, cheias de
móveis vistosos e ornamentadas, por
fora, com carros do último ano. A
felicidade sem dinheiro só aparece
de vez em quando e, assim mesmo, com alguma
obsessão de amor, com tentativas
de casamentos impossíveis ou impraticáveis,
pois casar exige quase sempre o mesmo “status”
social, uma proximidade de classes.
Assistir a uma novela, de princípio
ao fim, é candidatar-se para muito
sofrimento, muita angústia, um convívio
diário com toda espécie de
paixão, embora algumas vezes gratificante
pelos toques de humorismo, de esperança,
de romantismo, de sabedoria, em proporções
que só o drama ou a comédia
podem oferecer. Mas como há vocação
para tudo, gosto para todas as situações,
sejamos telespectadores assumidos, porque
a vida é breve, e a dos outros é
sempre mais emocionante do que a nossa!