Corrente pra frente

Wanderlino Arruda

Sempre pensei que a mania de fazer e enviar correntes, diretamente ou pelo correio, para amigos ou para conhecidos, fosse uma dessas qualidades ou defeitos genuinamente brasileiros, um desses jeitinhos de levar alguma vantagem ou fugir de um supersticioso perigo desconhecido. É que a corrente, sempre feita em número de meia dúzia, manuscrita ou datilografada, contando uma estória de origem, motivos de princípio, de meio e de fim, sempre contendo ameaças a quem cometer a ousadia de interrompê-las. "Um fulano de tal não quis multiplicar a corrente recebida e enviar as cópias aos amigos e... caiu de avião, batendo numa serra do litoral, esborrachando-se, mergulhando no mar. Outro não deu prosseguimento em duas que recebeu e perdeu o emprego, passando a rechear as estatísticas dos desocupados. Outro fez tudo direitinho e... marcou os treze pontos na loteria esportiva, sozinho e bem acompanhado e, ainda por cima, tirou o primeiro prêmio na federal".

Correntes, correntes, já as vi de todas as maneiras possíveis, destinadas a ricos, a pobres e à classe média, baixa e baixíssima. Já as vi com todo tipo de redação, partindo de gente que entende, de gente que pouco mais sabe do que fazer um "o" com fundo de garrafa. Há daquelas correntes que chegam em envelopes baratos, capeando desmoralizadas notas de um barão, daquelas amarelinhas, que nenhuma criança aceita mais, nem por brincadeira. Há as que já estão sendo programadas por computador, controladas em listagens sofisticadas, encaminhadas eletronicamente mediante pagamento de comissões e corretagens, com "satisfação garantida ou seu dinheiro de volta", como se fossem de vendedoras de eletrodomésticos. Tudo muito interessante e bastante curioso...
Não foi pequena minha surpresa, quando recebi, há poucos dias, de minha amiga e samideana Maria Goretti Neves, uma corrente realmente internacional, com passagens por vários países destinada a esperantistas, tendo como agrado o recebimento, em linha final, de centenas ou milhares de cartões postais. Iniciada na Alemanha, seu exemplar foi remetido por correspondente que ela tem na Polônia, o primeiro nome endereçado para o sul da Rússia.
Fiquei curioso e interessado, e lá vão correntes redigidas em esperanto para amigos meus moradores na Suécia, nos Estados Unidos e na França, além de outros que moram aqui mesmo nesta cosmopolita Montes Claros.
Mas, de todas as correntes, a mais interessante que recebi na longa caminhada da vida é a que passo a transcrever, nenhum comentário fazendo, e deixando a apreciação por conta do leitor que, a partir de agora, passa também à condição de destinatário. E que faça bom proveito. Ei-la:
"Esta corrente foi feita para homens comprometidos e esgotados como você: não é necessário dinheiro. Faça 5 (cinco) cópias e mande para seus amigos na mesma situação e que sejam de inteira confiança. Em seguida, empacote sua mulher e envie para o primeiro da lista, acrescentando seu nome em último lugar. Quando seu nome estiver no primeiro, você receberá 16.478 mulheres, e algumas delas poderão ser interessantíssimas. Não quebre a corrente. Um sujeito quebrou-a e recebeu a mulher de volta. Um amigo meu já recebeu 18. Hoje, foi o enterro dele. Tinha nos lábios um sorriso nunca visto durante toda a sua vida... Mantenha a corrente e morra contente".

Wanderlino Arruda